Contos

Polo Positivo

Eu não conseguia tirar os meus olhos dele. Ele era quase como um ímã, que atraía o meu olhar, não importando onde estivéssemos. Comecei a pensar que ele era um polo positivo, mandando embora toda a minha negatividade e só aumentando a atração que eu sentia por ele. Era como se todos os meus problemas desaparecessem quando ele estava por perto e tudo o que eu conseguia pensar é que eu não queria mais estar em qualquer outro lugar. Ele tinha o poder de fazer eu me sentir mais interessante, mais confiante e mais feliz, e por mais que eu continuasse sendo a mesma pessoa, parecia que eu estava vivendo em uma outra vida.

Sabe aquela pessoa que te faz esquecer tudo? Que te hipnotiza? Que te faz querer mais, sonhar mais, viver mais? Ele tinha esse efeito em mim. Por algum tempo, foi ele que me manteve focada em não desistir de mim mesma, mas agora era muito mais do que isso. Ele fez eu esquecer tudo o que eu sentia, tudo o que eu tinha sofrido até então e tudo o que eu quis por tanto tempo. Eu não vi as engrenagens funcionando na minha cabeça enquanto tudo isso acontecia, mas quando eu me dei conta e olhei mais uma vez para aqueles olhos verdes, eu sabia que tudo estava diferente. E eu não ia deixar nada daquilo ir embora, não agora.

Ele tinha chegado não fazia muito tempo, mas desde o momento em que eu notei a presença dele ali, não conseguia ficar muito tempo sem correr os olhos pelo salão para ver o que ele estava fazendo. Conversava um pouco, ria um pouco, tomava minha água sem gás e procurava por aqueles pares de dentes que faziam meu coração bater mais forte. Não pude deixar de notar que assim que bati os olhos nele pela primeira vez aquela noite, eu gelei de cima a baixo e minha barriga parecia um pedaço de iceberg… Foi como se todas as minhas expectativas tivessem sido atendidas e ele tivesse caído de paraquedas na minha frente. Na hora certa.

Depois de um certo tempo, eu sabia que ele já tinha percebido que eu estava ali. Enquanto eu passeava de um lado para o outro, eu sentia o olhar dele acompanhando cada um dos meus passos, tentando de alguma forma chamar a minha atenção de ele queria conversar comigo. Não sei se foi por medo ou pelo gostinho de me sentir superior, mas eu não olhei para ele nenhuma vez em que eu reparava ele olhando para mim. Mas eu sabia que ele queria, eu sabia que ele estava sentindo o mesmo que eu. Continuei fazendo jogo duro por mais um tempo, mas meu coração já estava derretido e eu não conseguia mais pensar em nada mais que não fosse colar do lado dele e ficar lá — mais ou menos — para sempre.

E então nossos olhos eram dois ímãs… Era quase que impossível olhar para ele sem que os seus olhos estivessem focados nos meus. Ainda sem saber o que fazer, eu desviava o olhar para outro lado e engatava uma conversa animada com alguém, tentando esquecer que meus joelhos tremiam sem parar e que minhas mãos suavam em volta do meu copo de água. Percebi que ele me olhava pelos espelhos, e toda vez que nossos olhos se cruzavam por lá, eu soltava uma risadinha nervosa, apesar de estar achando tudo aquilo sensacional. Torcia para que ele tomasse a iniciativa de vir até mim e quebrasse aquele gelo, que beirava cerca de trinta graus negativo.

E então um flashback passou pela minha cabeça… Me lembrei o quanto eu vibrava por dentro sempre que dançava com ele e do quanto ele me fazia rir de boba enquanto me girava e contornava o salão comigo em seus braços. Perdi a conta de quantas vezes ele pediu para eu deixar o braço firme para que ele pudesse me conduzir e de como ele estendia a mão para frente sempre que queria dançar comigo. Gostava de fazê-lo rir enquanto eu falava alguma das minhas besteirinhas no meio de um gancho ou de um cruzado — e amava ainda mais olhar aquele sorriso que até me desconcentrava e fazia eu errar a sequência de pernas. Me lembrei da risada gostosa dele e do olhar que ele sempre me lançava após fazer uma piadinha, pois sabia que eu ia rir junto com ele. E então eu despertei…

Por mais que eu não cansasse de ficar brincando de encontrar os olhos dele pelos cantos, eu precisava ir embora. Estava cansada, com dor nas pernas e precisava de um banho para relaxar, depois de um dia corrido e cheio de emoções. Larguei o meu copo em cima da mesa e saí para pegar minha bolsa, na esperança de que algo mágico acontecesse naqueles cinco minutos antes de eu ir embora. Quando eu voltei, dei de cara com ele na porta. Ambos nos assustamos, mas foi impossível não sorrirmos um para o outro neste momento. Fiquei sem jeito de sustentar o olhar dele assim tão de perto e baixei os olhos, quase que pedindo desculpas por ter passado a noite inteira fazendo aquilo. E então tudo aconteceu tão rápido que eu mal me recordo o que aconteceu.

Senti meu corpo ferver e minha cabeça tontear de prazer quando ele tocou na minha mão. Olhei séria para ele, mas ele sorria abertamente. Fechei os olhos e sorri de volta para ele, para em seguida ouvir aquela gostosa risada curta dele. Ele ficou me encarando por alguns segundos e eu percebi que seus olhos brilhavam mais do que diamantes. Ele perguntou se eu já estava indo embora e, quando eu respondi que sim, ele me abraçou com força, quase que me sufocando. Ficamos ali por algum tempo, ele acariciando meus cabelos e eu sentindo o perfume suave que exalava da sua nuca. Não precisamos dizer nada um ao outro, aquilo tudo era suficiente.

Ele me soltou e me olhou com os olhos mais doces que eu já vi nesta vida. Segurando minhas duas mãos, ele se abaixou e plantou um beijinho no cantinho da minha boca, certificando-se que aquilo me deixaria tonta. Eu passei as costas da minha mão no rosto dele, apertando de leve o seu queixo com o meu polegar, e acenei com a cabeça que estava indo embora. Ele mordeu o canto do lábio e me acompanhou com os olhos até a porta. Chegando lá, eu virei de lado e olhei pela última vez para ele, que ainda estava parado no mesmo lugar com um sorriso de lado a lado. Sorri de volta e murmurei um “boa noite” por entre os dentes. Ele riu, ficou quieto por alguns segundos e então murmurou de volta para mim: “eu também”.

A gente realmente não precisava falar nada um para o outro. Ele tinha entendido e eu também.

11 Comentários

  • Beca

    Ai que texto lindo Fernanda. Cada parágrafo foi de tirar o fôlego. Sinto falta de me apaixonar… Da cumplicidade, de quando um olhar basta para dizer tudo. E que sedutor esse rapaz, heim? Me lembrou o texto do tal “gravata”. Maravilhoso, só isso!
    Beijo grande.

  • Adriel Christian

    O SEU MELHOR TEXTO DO ANO NA MINHA OPINIÃO!

    Foi tão real, Fê! Eu imaginei cada detalhe, cada movimento da dança… A hhhhh! Incrível essa sensação!

    Deixando de lado meu lado “fã-da-escritora-Fernanda”… A história mesmo sendo “ficção” é tão linda, pareceu real como se eu fosse invertido e eu estivesse vivendo a história. Na verdade, está acontecendo algo parecido, mas não sei se o final vai ser tão bom quanto o do história.

    Cara, você me surpreendeu no final. Eu jurava que ela ia embora e a história ia acabar, mas daí veio você com toda sua criatividade e colocou a parte do “eu te amo” oculta. 🙂

    Excelente texto! Merece entrar pra Academia de Letras, e não é só por esses textos, viu? Tem “A Partida” que é um dos meus preferidos…

    Bjs!

  • Pamela

    Ai ai, essas frases do tipo “não precisávamos falar nada um para o outro”, “ele sentia o mesmo que eu” e etc…como me fazem lembrar de alguém, com olhos verdes também rsrs 😉

    =***

  • Daniele

    Que texto maravilhoso, envolvente! me transportei para o local e vivi as cenas muito bem descritas por você. Momentos mágicos hein! Pena que era ficção. Será?!? rsrs…

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